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  • PROJETO TRAZ CONSCIÊNCIA NEGRA À PONTAL DO PARANÁ

    Terça-feira, 10 de maio de 2022

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    Luiz Michelin Junior - Imprensa


    A professora, doutora, Edicélia Maria do Santos de Souza, servidora de Pontal do Paraná como professora da Escola Especial Ilha do Saber há 19 anos foi a criadora do Projeto Afrolip (Afrodescendentes do Litoral Paranaense).
     

    O projeto foi iniciado em 21/06/21 por conta da criação do conselho de igualdade racial, criado em 2018. E em 23/06/21 foi criado o dia da Consciência Negra de Pontal do Paraná.

     

    O projeto prevê a desconstrução do racismo a partir da educação infantil, começando pelos CMEIs (Centro Municipal de Educação Infantil), promovendo a formação dos professores e educadores que estão no dia a dia das crianças, para que se construa nelas a identidade da criança negra, da criança indígena, da criança quilombola, trabalhando toda a diversidade de etnias desde a infância.

     

    A Dra. Edicélia relata que a esperança é que as crianças cresçam com a conscientização de que todos somos iguais em quase todas as nossas vontades e necessidades, que somos diferentes apenas em nossas características: “Temos a questão do cabelo crespo, da criança com cabelo ruivo, da criança gorda, da criança mais magra, o projeto prevê um trabalho de igualdade entre toda essa diversidade com foco voltado pra desconstrução do racismo com outra criança negra que é a mais prejudicada”.

     

    Os professores de Pontal do Paraná estão recebendo material do Projeto Afrolip e sendo treinados para adquirirem conhecimento em cima da desconstrução do racismo, que muitas vezes gera o bullying no ambiente escolar. Este planejamento visa a igualdade, para que a criança tenha suas características e todos os seus pontos valorizados.

     

    Questionada se há casos de racismo em nosso município a professora respondeu: “Sim, já tivemos várias denúncias, estamos visitando as escolas desde setembro do ano passado, propondo as diretoras, vice-diretoras e aos professores uma comissão de diversidade dentro de todas as escolas. Já foi criado dentro dos CMEIS e das escolas de ensino fundamental. Essa comissão geralmente é formada por uma pessoa que prepara a alimentação, uma pessoa da comunidade e a direção da escola ou o pedagogo.

     

    Essas pessoas vão ficar de olho nas crianças nas ações, nos conflitos, e todas as questões na hora do intervalo. É aí que um olha para o outro (as vezes até os pequeninos) e percebem a diferença, começando os apelidos efêmeros imitados pela TV. As mídias sempre imitam isso, então, nós iniciamos dentro da escola a desconstrução do racismo e observamos de perto cada caso. Essa comissão é responsável pela averiguação desses conflitos. Por exemplo: em 2022, nós visitamos a escola Arthur Tavares, onde tivemos dois casos de racismo no período da manhã e dois no período da tarde. Como são crianças nós não podemos responsabilizar os pais e levá-los à justiça, por isso o projeto prevê (de acordo até com a Secretaria de Educação), ações positivas, de sensibilização das crianças, valorizando as crianças da nossa cultura negra. Porque geralmente o racismo aconteceu por conta da pele, por conta do cabelo crespo, aliás o que mais pega para a criança negra, principalmente a menina é o cabelo crespo”.

     

    Quando ocorrem os casos de racismo há uma intervenção de três dias na escola (ou CMEI), com ações, esclarecendo aos professoras, o pessoal da cozinha, os técnicos administrativos, treinando-os para saberem lidar com tal fato. Geralmente vão a Dra. Edicélia e mais um profissional no assunto, para que possam trabalhar em ações afirmativas, mostrando a valorização do negro.

     

    “Por que em nossa sociedade não encontramos muitos profissionais negros? São poucos professores, poucas pessoas em cargos públicos. Isso acontece porque a criança sofre esse racismo e acaba abandonando os estudos. A escola acaba sendo para ela um ambiente de sofrimento, ao invés de ser de acolhimento. Então, assim que ela aprende a ler e escrever acaba desistindo, não se formando e consequentemente não adquirindo um cargo por conta disso.

     

    Tivemos um caso que recebi uma denúncia de uma criança de 6 anos que estava na sala de aula e foi tirada pelos colegas da primeira fila de carteiras onde ela estava sentada. Seus colegas brigaram e falaram que ela tinha o “cabelo ruim e duro”, que era “feia”, e que tinha “um beiço muito feio” e mandaram ela para trás e ela foi. Gritaram coisas terríveis, que não tem como uma criança suportar. Ela entra em sofrimento psíquico absoluto. A professora não viu o conflito porque a sala estava cheia, ela atende muitos alunos. Ao ouvir o burburinho ela mandou ficarem em silêncio. Então como diz a autora Eliane Cavaleiro num livro de pesquisa de 2012 com doutorado que ela fez: “Do silêncio do lar ao silêncio escolar”. A criança negra sai de casa em silêncio, com o cabelo extremamente puxado e amarrado para “não ser visto” e entra na escola com outro silêncio quando o conflito começa. A professora diz: “silêncio” e não sabe o que aconteceu, não tendo como culpar ninguém. Fui até a escola, conversei com a professora. E a criança me relatou: “Fui conversar com a minha professora, ela não me socorreu e eu não quero mais ir pra escola”. Muitas vezes é até um despreparo da professora, pois ela não teve essa disciplina na faculdade. Então nós trabalhamos com o que preveem as leis: 10639 (inclusão no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática "História e Cultura Afro-Brasileira) e 11465 (obrigatoriedade da temática “História e cultura afro-brasileira e indígena)”. Nesse caso a criança ficou esperando a desconstrução do racismo pela professora (que era sua heroína) e ela se omitiu. Após a nossa conversa ela procurou a aluna. Quando cheguei em casa recebi um áudio da menina me dizendo: “Profe, obrigada que você veio na minha escola me ajudar com a minha professora. Ela conversou comigo e me deixou sentar na frente, perto dela e me pediu desculpas. A mãe da menina respeita muito meu trabalho e o da direção da escola. Pois para ela o que interessa não é a punição do outro e sim a felicidade da filha”, contou a professora Edicélia.

     

    Segundo ela, é isso que o Projeto Afrolip busca: a sensibilização e não a criminalização, pois a criança vai crescer em um ambiente escolar e as famílias não podem se tornar inimigas por conta disso.

     

    O projeto prevê uma formação online dos professores com um certificado de 60 horas em um curso denominado ERER (Educação das Relações Étnico-Raciais). Só no passado foram 10 lives com este tema. Para tanto a Dra. Edicélia conta com a ajuda de profissionais da área de vários estados brasileiros.

     

    Além disso tudo Pontal do Paraná já conta com outra vitória: um sistema de cotas para pessoas negras em concursos públicos ou PSS (Processo Seletivo Simplificado): “Geralmente nós temos apenas 10% das vagas ofertadas, mas no nosso município foi aprovada uma lei que partiu da vereadora Rosiane Rosa Borges (Nega), que prevê um percentual de 20% das vagas", ressaltou a professora.

     

    Nos dias 04 e 05/05/22 aconteceu em Curitiba o Seminário de Promoção da Igualdade Racial na Gestão Pública e Privada, desenvolvido pela a Secretaria de Justiça, Família e Trabalho do Paraná. Neste evento o Projeto Afrolip foi apresentado pela Dra. Edicélia para mais de 30 cidades e municípios do estado do Paraná, marco importante na luta contra o racismo.


    Contato do Projeto Afrolip:

    (41) 99706-4165

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